segunda-feira, 28 de março de 2011

Juristas afirmam: novo projeto de Código Florestal é inconstitucional e não resiste a uma análise do STF

23/03/2011 - 18:12
Na última sexta-feira (18), a Ordem dos Advogados do Brasil, seccional São Paulo, organizou um extenso seminário para discutir a proposta de reforma no texto do Código Florestal, em tramitação na Câmara dos Deputados. Segundo Carlos Alberto Maluf Sanseverino, presidente da Comissão de Sustentabilidade e Meio Ambiente da OAB-SP, o debate teve o objetivo de levantar subsídios para a posição que a Ordem tomará em breve sobre o tema e também ampliar a discussão no conjunto da sociedade. “Diante das divergências, um amplo debate deve ser travado com todos. Isso é democracia”, afirmou Luiz Flávio Borges D´Urso.
Uma das mesas do seminário discutiu os aspectos jurídicos do relatório do deputado Aldo Rebelo, aprovado em Comissão Especial na Câmara. Na avaliação do professor Celso Fiorillo, mestre em Direito Ambiental e livre-docente pela PUC/SP, o projeto tem inúmeras inconstitucionalidades e sua tendência é ser eliminado pelo Supremo Tribunal Federal.
“O texto é uma verdadeira aberração do ponto de vista jurídico. Propõe perder o equilíbrio do meio ambiente por uma contingência econômica, e sacrificar a qualidade de vida da população em nome da pseudo necessidade de aumento da produção. O povo brasileiro está sendo atropelado”, acrescentou o promotor de Justiça do Meio Ambiente Fernando Akaoui, que foi coordenador de meio ambiente do Ministério Público em São Paulo. Durante o seminário, Akaoui entregou à OAB estudos técnicos do MP sobre os impactos do novo Código Florestal.
Para o procurador do Estado e ex-secretário estadual do Meio Ambiente, Pedro Ubiratan Escorel de Azevedo, o texto não resiste a um exame de constitucionalidade. “É um projeto que causa um desserviço à recomposição florestal. O Código Florestal atual já prevê mecanismos para a regularização das propriedades desmatadas, mas ninguém está fazendo nada porque esperam a votação do novo projeto”, criticou, em referência ao artigo que libera os proprietários rurais da obrigação de reflorestamento das áreas de Reserva Legal e anistia aqueles que descumpriram a legislação em vigor.
“É uma lei que não tem nenhuma virtude, que nivela por baixo a questão. Quem cumpriu a legislação terá diploma de trouxa”, disse Ubiratan. “É ruim mudar uma lei por conta de dificuldade de aplicabilidade da norma. É o mesmo que quebrar o termômetro para acabar com a febre do paciente”, comparou.
Em sua palestra, a Procuradora da República em São Paulo Ana Cristina Bandeira Lins elencou um conjunto de princípios constitucionais que estão sendo, segundo ela, “rasgados” com o projeto de mudança do Código Florestal, como o princípio do não-retrocesso, da precaução e do poluidor pagador. Ela destacou o perigo de um dos artigos do texto que autoriza o “uso alternativo do solo”, inclusive nas reservas ambientais da Amazônia, que libera a exploração para qualquer uso.
“O Brasil está sendo irresponsável com este Código do “Desflorestamento”. O interesse público é superior ao privado. Mas para os produtores rurais é mais fácil defender o uso de 100% das terras para aumentar a produção do que melhorar as técnicas produtivas, porque isso é mais caro”, analisou Ana Cristina. Sobre o impacto da redução das Áreas de Preservação Permanente, como topos de morros, encostas e margens de rios e córregos, a Procuradora da República foi rígida: “como a natureza não nos premiou com terremotos e tsunamis, estamos cavando nossas próprias desgraças, como em Santa Catarina, São Luis do Paraitinga e Rio de Janeiro”.
“O que estamos vendo é uma tentativa apressada de reforçar o Código Florestal com a primazia de grupos e interesses privados, e isso não é democrático. Não podemos ir na contramão da história”, alertou a Desembargadora federal Consuelo Yoshida.
“Suicídio em massa”
Além da ampliação do debate para o conjunto da sociedade brasileira, a Ordem dos Advogados do Brasil pediu equilíbrio na discussão do novo Código Florestal. O presidente nacional da OAB, Ophir Cavalcante, lembrou que, ao longo das últimas décadas, o Código não impediu o desmatamento, mas sem ele teria sido muito pior.
“Nem ao céu nem ao inferno. As discussões em torno da atualização do Código Florestal devem obrigatoriamente incorporar a ideia de sustentabilidade ambiental para o desenvolvimento sócio-econômico. E a consciência ambiental deve levar também em conta as necessidades internas (e externas) de alimentos”, apontou. “Os produtores rurais e as empresas precisam ter em mente que o avanço predatório equivale a um suicídio em massa. Os recursos naturais não são renováveis, se esgotam, mas sendo administrados com a devida parcimônia, cuidado e zelo podem ajudar a humanidade por muito tempo ainda”, acredita.
Na avaliação da OAB, os efeitos da ação predatória do homem sobre a natureza deixaram de ser uma especulação. Em apenas cinco anos, o mundo perdeu 36 milhões de hectares de florestas. Mais de 16 mil espécies de animais entraram na lista de risco de extinção.
“Em nosso quintal, temos um triste legado para as futuras gerações: as florestas brasileiras e todas as suas riquezas naturais estão a perigo”, disse Cavalcante. “É preciso ter consciência crítica acerca das principais conseqüências do desmatamento: destruição da biodiversidade; genocídio e etnocídio das nações indígenas; erosão e empobrecimento dos solos; enchente e assoreamento dos rios; diminuição dos índices pluviométricos; elevação das temperaturas; desertificação; e proliferação de pragas e doenças. São dados para reflexão, não para disseminar ódios e rancores. O Código Florestal precisa incorporar uma tomada de consciência que coloque o futuro do país dependente da proteção ecológica. Necessitamos de um ordenamento jurídico nesse campo que reflita essas preocupações básicas, sem inviabilizar a produção de alimentos e, ao mesmo tempo, sem transformar a terra em deserto”, concluiu.
O mandato do Deputado Federal Ivan Valente participou no seminário, que contou ainda com a presença do deputado federal Ricardo Trípoli, que também integra a Frente Ambientalista, do ex-deputado federal Fábio Feldmann e do deputado federal Aldo Rebelo, que depois de apresentar seu relatório não pôde participar do debate em função do atraso na programação.
“O envolvimento de organizações como a OAB no debate do Código Florestal é fundamental para que o interesse público, e não privado, corporativo, prevaleça na discussão da lei. A bancada ruralista está pressionando fortemente a Câmara pela rápida votação do texto porque sabe que, se a sociedade brasileira como um todo for ouvida, a preservação do meio ambiente será colocada em primeiro lugar. Esperamos que a Ordem divulgue brevemente seu posicionamento, e que o debate seja feito dentro do tempo que a complexidade do tema requer”, afirmou Ivan Valente.

Fonte:
http://www.ivanvalente.com.br/2011/03/juristas-afirmam-novo-projeto-de-codigo-florestal-e-inconstitucional/

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Charge do Toninho

Charge do Toninho

"AQUILO QUE NÃO PODES CONSERVAR NÃO TE PERTENCE"

Excelente frase divulgada na coluna FALANDO SÉRIO de Wellington Ramos do JM. Espero que muitos ruralistas e políticos a tenham lido.